Pandemia e ensino superior: novos tempos, novos desafios

Fonte da foto: arquivo pessoal

Por Gildo Volpato

A pandemia do novo coronavírus vem provocando mudanças no comportamento da sociedade, em muitos sentidos e em diferentes formas, dependendo do segmento ou área de atuação, ou mesmo nos simples hábitos e gestos da vida cotidiana.

A princípio trouxe medo, mas aos poucos, este momento diferente, “extraordinário” foi sendo assimilado, melhor compreendido e suscitou mudanças nas formas de operar com determinadas atividades humanas. Uma delas, que sofreu um forte impacto foi a educação, pois o modelo jesuítico de salas de aulas retangular, carteiras uniformes, colocadas uma atrás da outra, quadro negro (em muitas salas de aula substituído por de vidro ou outro material), ainda prepondera na sociedade contemporânea.

O quadro negro serviu durante muito tempo, mas é um objeto vazio e fixo na parede, próprio para uma comunicação unidirecional. Neste sentido a pandemia pôs a nu as fragilidades do sistema de ensino e do modelo escolar. Apesar de conhecermos experiências que romperam com estes modelos de sala de aula, de a educação a distância já ser uma realidade em nosso país e em grande parte do mundo, de os ambientes virtuais já fazerem parte do ensino presencial, sobretudo no ensino superior, o impacto do momento mexeu profundamente com a estrutura, com os condicionantes que garantiam a continuidade deste modus operandi.

A pandemia, fez com que todos se afastassem, se isolassem em seus ambientes familiares e a única forma de comunicação com o mundo externo, foi por meio das novas tecnologias digitais.

A partir desta nova realidade, muitas Instituições de Ensino Superior (IES), ficaram na discussão sobre utilizar ou não o “ensino remoto” e acabaram sendo vencidas pelas resistências e pré-conceitos de professores e continuaram esperando o isolamento passar.

Outras universidades, no entanto, por meio de seus gestores, tiveram que tomar decisões rápidas (sobretudo as não públicas, no caso do Brasil), sob pena de verem seus estudantes abandonarem os cursos, trancarem a matrícula, ou substituírem por cursos na modalidade de Ensino a Distância (EaD), principalmente por serem de menor custo.

Os professores, mesmo aqueles que se estressavam com os alunos que utilizavam o celular com internet (que tem as enciclopédias, é móvel e permite uma comunicação multidirecional), tiveram que se reinventar. Afinal comparando com o quadro negro, um celular ou um computador com internet, orientado e mediado por um professor qualificado, tem muito mais condições de ampliar os modos de comunicação e criação e de proporcionar diferentes situações e dinâmicas de aprendizagem.

Para as universidades com visão de futuro (e o futuro, no meu modo de ver, foi acelerado no curso da história, pelo novo coronavírus, pelo menos no campo da educação), encararam como um período desafiador, mas de grandes aprendizados e experiência, pois logo investiram em transformação digital envolvendo plataformas de web conferência, como o Google Meet, Zoom, Teams, etc, e sistemas de gestão de conteúdos digitais (provas, vídeos, biblioteca digital). Na Universidade em que atuo, estamos utilizando todos os recursos da G-suite do Google, para garantir as aulas remotas, com a presença do professor em tempo real com os estudantes.

Neste segundo semestre, o grande desafio, está sendo a implantação do formato híbrido (a depender das condições pandêmicas). Nele os professores (exceto os que integram o grupo de risco), estão no campus e suas aulas são transmitidas em tempo real. Os acadêmicos que tiverem condições e interesse em participar das aulas presencialmente, participam em um sistema de rodízio, garantindo em sala de aula o afastamento preconizado pelas regras de segurança.  Para atender todos os estudantes de todos os cursos, a IES teve que equipar os espaços formativos com câmera, áudio, vídeo e microfone de lapela (individual para cada professor) e data show para a ampliar a interação do professor com os estudantes que estiverem presencialmente e os que acompanham de modo remoto pelo Google Meet).

Isso demonstra o quando nós precisamos de gestores ousados, capazes de mobilizar a comunidade acadêmica em busca de superação das dificuldades do momento e de universidades com grande autonomia e liberdade, com espírito crítico, comprometidas com a inovação pedagógica, que se utilize de plataformas e recursos digitais.

No meu entender, tudo indica que mesmo após a pandemia, não haverá retorno ao ensino cem por cento presencial, e o modelo híbrido é o que está sendo gestado, pois sabemos que nem todas as habilidades, competências e atitudes podem ser desenvolvidas de modo virtual, mas tivemos a oportunidade de perceber que muitos conteúdos teóricos podem ser socializados dessa forma, sem prejuízo no aprendizado.

Novos tempos, novos desafios lançados e um deles é assegurar o acesso de todos e humanizar o ambiente digital, pois ele não é neutro, ele é “meio” de organização do conhecimento, de aprendizagem, de formação profissional, mas também pessoal.

*Gildo Volpato: Ex Reitor da Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC), vice presidente do Conselho Estadual de Educação de Santa Catarina (CEE/SC), professor pesquisador do Grupo de Estudos sobre Universidade (GEU/UNESC).

Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a visão do INPEAU